quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Evolução é sobrevivência dos seres mais generosos

Cientistas americanos continuam a juntar provas para suportar a sua teoria de que a generosidade compensa mais do que o egoísmo, ou seja, são conferidas vantagens evolutivas aos seres com comportamentos altruístas. Na espécie humana, a cooperação e a empatia parecem ser as melhores estratégias para conseguir passar os genes para a geração seguinte.

Apesar da ideia ser relativamente antiga, nunca foi dominante no pensamento sobre evolução das espécies. Ao longo de mais de um século, o ensino da teoria de Charles Darwin colocou a ênfase no mecanismo da selecção natural dos mais aptos. Mas recentemente os biólogos começaram a defender que a generosidade tem um papel muito mais importante na evolução da espécie humana do que a força ou a competição.
O campo dos que defendem a ideia da sobrevivência dos mais generosos tem estado a reunir dados que suportam a sua teoria. Uma equipa de cientistas de Berkeley, nos EUA, publicou os resultados de uma experiência que sugere as vantagens do comportamento altruísta na espécie humana. Outro estudo, virado para o funcionamento do cérebro, encontrou indícios que apontam para a existência de um gene que promove a empatia.

"As nossas crias são muito vulneráveis, por isso uma das tarefas fundamentais da sobrevivência humana e reprodução genética é tomar conta dos outros. Os seres humanos sobreviveram como espécie porque evoluiu a sua capacidade de tratar daqueles que precisavam e de cooperar. Como Darwin uma vez disse, a simpatia é o nosso instinto mais forte", afirmou Dacher Keltner, citado pela publicação online Science Daily. Keltner dirige um instituto de Berkeley que estuda a questão e é autor de um livro influente que defende a "bondade" natural do ser humano.
Um sociólogo de Berkeley, Robb Willer, acaba de publicar os resultados de uma experiência baseada em vários jogos complexos onde foi possível perceber que a generosidade dos jogadores era compensada com mais respeito dos outros jogadores, maior influência no grupo e maior número de presentes. Segundo Willer, os cientistas terão de responder muito menos à questão do porquê das pessoas serem generosas e muito mais a outra, porque são egoístas, pois este comportamento parece à partida não ter tantas vantagens.
Também começam a crescer os indícios de que a empatia implica predisposição genética. Um estudo de Laura Saslow e de Sarina Rodrigues (respectivamente de Berkeley e Oregon) concluiu que uma variação do gene receptor da hormona oxitocina (que estimula o comportamento social e o amor) torna as pessoas mais hábeis na interpretação do estado emocional dos outros humanos.
Estes são dois exemplos de um campo em expansão e que podia estar muito mais implantado se a biologia não se tivesse orientado, durante décadas, para a investigação da selecção natural dos mais aptos e para a competição.
Num artigo de Fevereiro, publicado em Psychology Today, Dacher Keltner lembrava que o conceito de "sobrevivência dos mais aptos" nem sequer é de Darwin, mas resulta da adopção das ideias de Herbert Spencer e dos darwinistas sociais do século XIX. Num dos seus livros, A Origem do Homem, Charles Darwin defendeu que os instintos maternais e sociais eram os mais poderosos.

Herta Muller recebe hoje Prémio Nobel


A escritora romeno-alemã Herta Mueller, 56 anos, recebe hoje em Estocolmo o prémio Nobel da Literatura, tornando-se na 12.ª mulher entre os 101 galardoados com a mais importante distinção literária.

Quando a Academia sueca anunciou o nome, a 08 de Outubro, a escritora nascida na Roménia e a viver na Alemanha era quase desconhecida em Portugal, onde apenas tinha editado dois dos 19 romances que publicou:"A terra das ameixas verdes" e "O homem é um grande faisão sobre a terra".
O comité Nobel justificou a opção por se tratar de uma obra que "com a concentração da poesia e a franqueza da prosa, pinta as paisagens dos desfavorecidos".
"Quem ganhou não fui eu, foram livros, e não a minha pessoa, e julgo que é a melhor forma de lidar com a situação", exclamou então a laureada, nascida a 17 de Agosto de 1953 na cidade romena Nitzkydorf, na região de Banat, e vive actualmente em Berlim.
Herta Mueller foi proibida de publicar na Roménia por ter criticado publicamente o regime de Ceausescu, e devido à censura e perseguição de que foi alvo, emigrou em 1987 para a Alemanha com o marido, o poeta Richard Wagner, também nascido naquela região romena.
Com uma obra composta por 19 romances, a escritora estudou literatura alemã e romena na Universidade de Timisoara, na Roménia, e trabalhou como tradutora.

Desde os anos 1980 que tem acumulado galardões, sobretudo na Alemanha, onde foi distinguida com o Prémio Joseph Breitbach de literatura alemã. Em 2004 recebeu o prémio de literatura da Fundação Konrad Adenauer e, em 2006, o Prémio Würth de literatura europeia.

quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Frase do dia

"A erosão dos padrões, o assustador avanço da iliteracia política e a vitória do descalabro sobre a consciência constituem a representação da vida política portuguesa."

Baptista-Bastos, "Diário de Notícias", 09-12-2009

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Feliz Natal

"O Google é uma tragédia para os jovens"

O comissário da nova exposição no Louvre, em Paris, fala do lugar que as listas ocupam na história da cultura e dos modos como tentamos não pensar na morte. Um intelectual em discurso directo

As listas estão na origem da cultura. Fazem parte da história de arte e da literatura. De que precisa a cultura? De tornar o infinito compreensível . Também precisa de criar ordem - nem sempre, mas frequentemente. E, enquanto seres humanos, como enfrentamos o infinito? Como se pode tentar captar o sentido do incompreensível? Por meio de listas, catálogos e colecções em museus, e recorrendo a enciclopédias e dicionários. Há um fascínio em enumerar as mulheres com quem Don Giovanni dormiu: 2063, a acreditar em Lorenzo da Ponte, libretista de Mozart. Também temos listas inteiramente práticas - listas de compras, testamentos, ementas - que são actos culturais por mérito próprio.


A pessoa culta deve ser vista como uma guardiã que tenta impor a ordem nos locais onde predomina o caos?
A lista não destrói a cultura; cria-a. Para onde quer que olhe, na história da cultura, há-de encontrar listas. Com efeito, há uma gama estonteante: listas de santos, de exércitos e plantas medicinais, de tesouros e de títulos de livros. Pense-se na natureza das colecções do século XVI. Aliás, os meus romances estão cheios de listas.
Os contabilistas fazem listas, mas elas também existem nas obras de Homero, James Joyce e Thomas Mann.
Pois. Mas estes, obviamente, não são contabilistas. No "Ulisses", James Joyce descreve o modo como o seu protagonista, Leopold Bloom, abre as gavetas e tudo o que nelas encontra. Eu considero isso uma lista literária, e ela diz muito sobre Bloom. Ou então tomemos Homero, por exemplo. Na "Ilíada", ele tenta dar a noção do tamanho do exército grego. De início, recorre a comparações: "Tal como um grande incêndio de floresta, rugindo no topo de uma montanha, se avista ao longe, assim também, ao marcharem, o brilho das armaduras iluminava o firmamento". Mas não fica satisfeito. Não consegue encontrar uma boa metáfora e, por isso, pede às musas que o ajudem. Então tem a ideia de enumerar muitos, muitos generais e os seus navios.
Mas, ao fazê-lo, não estará a desviar-se da poesia?
No princípio, pensamos que uma lista é uma coisa primitiva e típica das culturas mais antigas, que não tinham uma concepção exacta do universo e que, portanto, estavam limitadas a enumerar as características a que conseguiam dar nome. Contudo, na história da cultura, as listas continuaram a prevalecer. Não são de modo algum uma mera expressão das culturas primitivas. Na Idade Média já havia uma imagem muito clara do universo e também havia listas. Uma nova mundividência baseada na astronomia dominou a Renascença e a época do Barroco e as listas continuaram a ser usadas. Também na era pós- -moderna as listas têm um papel importantíssimo . Têm uma magia irresistível.
Mas por que razão Homero enumerou todos aqueles guerreiros e navios se sabia que nunca poderia dar nomes a todos?
A obra de Homero toca repetidamente no topos do inexprimível. As pessoas fazem sempre isso. Sempre sentimos fascínio pelo espaço infinito, pela interminável série de estrelas e de galáxias. Como se sente uma pessoa quando olha para o céu? Pensa que não tem línguas suficientes que descrevam o que vê. Mesmo assim, as pessoas nunca deixaram de descrever o céu, recorrendo ao simples expediente de enumerarem o que vêem. Com os amantes passa-se o mesmo. Sentem uma deficiência na linguagem, uma falta de palavras que exprimam os seus sentimentos. E será que alguma vez os amantes desistem de o tentar fazer? Fazem listas: os teus olhos são tão belos, a tua boca também, e o teu colo... É possível ser muito pormenorizado.
Porque perdemos tanto tempo a tentar completar coisas que, de um ponto de vista realista, não se podem completar?
Nós temos um limite, um limite muito desanimador e humilhante: a morte. Por isso gostamos de tudo o que para nós não tem limites e que, portanto, não tem fim. É uma fuga que nos distrai de pensar na morte. Gostamos de listas porque não queremos morrer.
Na sua exposição no Louvre também vai expor obras das artes visuais, como naturezas-mortas. Mas essas pinturas têm molduras, ou seja, limites, e não podem representar nada mais do que aquilo que de facto representam.
Pelo contrário, o que nos leva a gostar tanto delas é acreditarmos que conseguimos ver nelas para além disso. Quem contempla uma pintura sente necessidade de abrir a moldura e ver como são as coisas à esquerda e à direita do quadro. Esse tipo de pintura é verdadeiramente como uma lista, um pedaço recortado do infinito.
Porque são essas listas e acumulações tão importantes para si?
As pessoas do Louvre contactaram-me e perguntaram-me se eu gostaria de comissariar uma exposição nesse museu. Pediram-me que apresentasse um programa de actividades. Só a ideia de trabalhar num museu foi suficiente para me atrair. Estive lá sozinho recentemente e senti-me como uma personagem de um romance de Dan Brown. Foi simultaneamente estranho e maravilhoso. Percebi imediatamente que a exposição iria ter como tema central as listas. Porque me interessa tanto esse tema? Não sei bem. Gosto de listas pela mesma razão que outras pessoas gostam de futebol ou de pedofilia. Gostos não se discutem.
Mesmo assim, é famoso por saber explicar as suas paixões ...
... mas não por falar sobre mim. Ora veja, desde os dias de Aristóteles que temos tentado definir as coisas com base na respectiva essência. A definição de homem? Um animal que age de maneira deliberada. Ora, os naturalistas levaram 80 anos a arranjar uma definição para o ornitorrinco. Foi extremamente difícil descrever a essência desse animal. Vive debaixo de água e em terra, põe ovos e, no entanto, é mamífero. E como era essa definição? Era uma lista, uma lista de características.
Seria certamente possível defini-lo se fosse um animal mais convencional.
Talvez, mas será que isso tornaria o animal interessante? Pense num tigre, que a ciência classifica como predador. Como iria uma mãe descrever um tigre ao seu filho pequeno? Provavelmente através de uma lista de características: o tigre é grande, é um felino, amarelo, às riscas, e forte. Só um químico se referiria à água como sendo H2O. Mas eu digo que é líquida e transparente, que a bebemos e que nos podemos lavar com ela. Agora pode finalmente perceber aquilo de que estou a falar. A lista é a marca de uma sociedade altamente avançada e culta porque nos permite questionar as definições essenciais. A definição essencial é primitiva em comparação com a lista.
Pode parecer que está a dizer que devemos parar de definir as coisas e que haveria vantagem se, em vez disso, as contássemos e enumerássemos.
Pode ser libertador. A idade do Barroco era uma época de listas. De repente, todas as definições eruditas feitas na era precedente deixaram de ser válidas. As pessoas tentaram ver o mundo a partir de uma perspectiva diferente. Galileu revelou novos pormenores sobre a Lua. E, na arte, as definições consagradas foram objectivamente destruídas e a diversidade de temas expandiu-se enormemente. Por exemplo, eu vejo as pinturas do Barroco holandês como listas: as naturezas-mortas com todos aqueles frutos e as imagens de gabinetes de curiosidades opulentos. As listas podem ser anárquicas.
Mas também disse que as listas podem trazer ordem. Quer então dizer que tanto a ordem como a anarquia se aplicam neste caso? Isso tornaria perfeitas para si a internet e as listas criadas pelo motor de pesquisa Google.
Sim, no caso do Google, ambos os conceitos convergem. O Google cria uma lista, mas no momento em que olho para a lista que o Google gerou, ela já mudou. Essas listas podem ser perigosas - não para os adultos como eu, que adquiriram conhecimento de outro modo -, mas para os jovens, para quem o Google é uma tragédia. As escolas deveriam ensinar a arte da discriminação.
Está a dizer que os professores deviam ensinar aos estudantes a diferença entre bom e mau? E, nesse caso, como o fariam?
A educação deveria regressar às estratégias das oficinas da Renascença. Aí, os mestres podiam não ser capazes de explicar aos alunos por que razão uma pintura era boa em termos teóricos, mas faziam-no de maneiras mais práticas. Olha, isto é o aspecto que o teu dedo pode ter e este é aquele que deve ter. Olha, esta é uma boa combinação de cores. A mesma abordagem deveria ser utilizada nas escolas quando se lida com a internet. O professor deveria dizer: "Escolham qualquer assunto: a história da Alemanha ou a vida das formigas. Pesquisem em 25 páginas web diferentes, comparando-as, e tentem descobrir qual tem informação importante e pertinente". Se dez páginas disserem a mesma coisa, pode ser sinal de que essa informação está correcta. Mas isso também pode acontecer porque alguns sites se limitaram a copiar os erros dos outros.
Quanto a si, é mais provável que trabalhe com livros; tem uma biblioteca de 30 mil volumes. Provavelmente não funciona sem uma lista ou catálogo.
Receio bem que, nesta altura, já sejam 50 mil livros. Quando a minha secretária os quis catalogar, pedi-lhe que não o fizesse. Os meus interesses mudam constantemente, tal como a minha biblioteca. A propósito, se os nossos interesses mudarem constantemente, a nossa biblioteca dirá algo de diferente sobre nós. Além disso, mesmo sem um catálogo, vejo-me forçado a lembrar-me dos meus livros. Tenho uma sala para literatura com 70 metros de comprimento. Percorro-a várias vezes por dia e sinto--me bem quando o faço. Cultura não é saber quando morreu Napoleão. Cultura significa saber como vou descobrir isso em dois minutos. Claro que, hoje em dia, posso encontrar esse tipo de informação na internet em menos de um ai. Mas, como disse, com a internet nunca se sabe.
Incluiu uma lista simpática feita pelo filósofo francês Roland Barthes no seu novo livro, "A Vertigem das Listas". Ele enumera as coisas de que gosta e as de que não gosta. Gosta de salada, de canela, de queijo e de especiarias. Não gosta de ciclistas, de mulheres de calças compridas, de gerânios, de morangos e de harpa. E o senhor?
Eu seria louco se respondesse; significaria rotular-me. Fiquei fascinado com Stendhal aos 13 anos e com Thomas Mann aos 15 e, aos 16, adorava Chopin. A seguir, passei a vida a tentar conhecer o resto. Neste momento, Chopin voltou a estar no topo da lista. Quando interagimos com as coisas da nossa vida, tudo muda. Se nada mudar, somos idiotas.

Exclusivo i /Der Spiegel





quarta-feira, 11 de novembro de 2009

"Alma Portuguesa" recupera músicas históricas



"Alma portuguesa" é o título de uma colectânea de que são editados esta semana três álbuns, recuperando algumas gravações históricas de 1952, entre as quais "Uma Casa Portuguesa" por Amália Rodrigues.

A série, editada pela Ovação, divide-se em "Fados", "Canções" e "Música Popular Portuguesa", comportando cada álbum 11 temas.
O CD de "Música Popular Portuguesa" integra nomes como a Ronda dos Quatro Caminhos com o tema "Chula de paus", Quadrilha, "Ai caramba", ou Arlindo de Carvalho, "Cantiga de Oledo".
Fonte da Ovação explicou à Lusa que esta série de três CD se insere no projecto de "reactivar os arquivos fonográficos da editora, trazendo alguns temas pela primeira vez em formato de CD".
O CD "Canções" integra vários nomes da música ligeira de distintas épocas casos de Tony de Matos numa gravação década de 1970, "Lado a lado", Mário Mata, "Não há nada p'ra ninguém" ou Paulo Bragança, "Pescador de olhos azuis".
Este CD inclui ainda Pedro Barroso, Cândida Branca Flor, José Cid, Tó Leal e Fernando Girão.
O CD "Fados" inclui o guitarrista Custódio Castelo, Alfredo Marceneiro, Lenita Gentil, Fernando Maurício, Maria da Fé, Rodrigo, Vicente da Câmara e Cidália Moreira.
Custódio Castelo toca o tema "Quase morna", de que é autor, a única guitarrada do CD.
Alfredo Marceneiro interpreta "Sonho dourado", um tema de Fernando Teles, cantado na melodia do fado Mouraria.
Fernando Maurício canta um tema de Júlio Vieitas "Eu quero".
De Maria da Fé é recuperado o tema "Portugal meu amor" de José Luís Gordo e José Fontes Rochas, gravado em 1976.
Nuno da Câmara Pereira surge com "Beijo alentejano" (Tiago Torres da Silva/Carlos Gonçalves), e é o único nome que se repete nesta primeira série de três discos, pois integra também o CD "Canções" com "Fragilidade" (uma adaptação de um original de Sting).
A mesma fonte salientou à Lusa que os 29 artistas escolhidos "espelham a diversidade e o potencial do catálogo" da discográfica. No próximo ano serão edtados novos volumes da colectânea "Alma Portuguesa".

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Os intocáveis

O processo Face Oculta deu-me, finalmente, resposta à pergunta que fiz ao ministro da Presidência Pedro Silva Pereira - se no sector do Estado que lhe estava confiado havia ambiente para trocas de favores por dinheiro. Pedro Silva Pereira respondeu-me na altura que a minha pergunta era insultuosa.


Agora, o despacho judicial que descreve a rede de corrupção que abrange o mundo da sucata, executivos da alta finança e agentes do Estado, responde-me ao que Silva Pereira fugiu: Que sim. Havia esse ambiente. E diz mais. Diz que continua a haver. A brilhante investigação do Ministério Público e da Polícia Judiciária de Aveiro revela um universo de roubalheira demasiado gritante para ser encoberto por segredos de justiça.

O país tem de saber de tudo porque por cada sucateiro que dá um Mercedes topo de gama a um agente do Estado há 50 famílias desempregadas. É dinheiro público que paga concursos viciados, subornos e sinecuras. Com a lentidão da Justiça e a panóplia de artifícios dilatórios à disposição dos advogados, os silêncios dão aos criminosos tempo. Tempo para que os delitos caiam no esquecimento e a prática de crimes na habituação. Foi para isso que o primeiro-ministro contribuiu quando, questionado sobre a Face Oculta, respondeu: "O Senhor jornalista devia saber que eu não comento processos judiciais em curso (…)". O "Senhor jornalista" provavelmente já sabia, mas se calhar julgava que Sócrates tinha mudado neste mandato. Armando Vara é seu camarada de partido, seu amigo, foi seu colega de governo e seu companheiro de carteira nessa escola de saber que era a Universidade Independente. Licenciaram-se os dois nas ciências lá disponíveis quase na mesma altura. Mas sobretudo, Vara geria (de facto ainda gere) milhões em dinheiros públicos. Por esses, Sócrates tem de responder. Tal como tem de responder pelos valores do património nacional que lhe foram e ainda estão confiados e que à força de milhões de libras esterlinas podem ter sido lesados no Freeport.

Face ao que (felizmente) já se sabe sobre as redes de corrupção em Portugal, um chefe de Governo não se pode refugiar no "no comment" a que a Justiça supostamente o obriga, porque a Justiça não o obriga a nada disso. Pelo contrário. Exige-lhe que fale. Que diga que estas práticas não podem ser toleradas e que dê conta do que está a fazer para lhes pôr um fim. Declarações idênticas de não-comentário têm sido produzidas pelo presidente Cavaco Silva sobre o Freeport, sobre Lopes da Mota, sobre o BPN, sobre a SLN, sobre Dias Loureiro, sobre Oliveira Costa e tudo o mais que tem lançado dúvidas sobre a lisura da nossa vida pública. Estes silêncios que variam entre o ameaçador, o irónico e o cínico, estão a dar ao país uma mensagem clara: os agentes do Estado protegem-se uns aos outros com silêncios cúmplices sempre que um deles é apanhado com as calças na mão (ou sem elas) violando crianças da Casa Pia, roubando carris para vender na sucata, viabilizando centros comerciais em cima de reservas naturais, comprando habilitações para preencher os vazios humanísticos que a aculturação deixou em aberto ou aceitando acções não cotadas de uma qualquer obscuridade empresarial que rendem 147,5% ao ano. Lida cá fora a mensagem traduz-se na simplicidade brutal do mais interiorizado conceito em Portugal: nos grandes ninguém toca.

Black Eyed Peas - Meet Me Halfway (official video)

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terça-feira, 3 de novembro de 2009

http://revistaantigaportuguesa.blogspot.com/2008_07_13_archive.html

Caravela seiscentista jaz no estuário do Cávado

Associação reivindica pela valorização do achado, descoberto há duas décadas


LUÍS HENRIQUE OLIVEIRA

No estuário do Cávado, mesmo em frente a Esposende, jaz o que resta de uma caravela do tempo dos Descobrimentos. Carbono 14 datou-a de 1548. Parte do navio foi encontrado em dragagens, realizadas há já duas décadas.
Uma caravela de 13 metros de comprimento e com capacidade para transportar até 40 toneladas de carga naufragou no estuário do Cávado em meados do século XVI. Transportaria uma elevada quantidade de cerâmica, ao que tudo indica proveniente de Barcelos. Os motivos do naufrágio são, ainda, desconhecidos da comunidade científica.
Há duas décadas, uma dragagem no estuário poria a descoberto um conjunto de madeiras e de peças de cerâmica - muitas delas inteiras. Porém, as peças trazidas à superfície não despertariam, então, a curiosidade do achador, que julgou tratar-se do local de naufrágio de barco que comercializasse na feira de Barcelos. Só uma década depois é que os achados seriam comunicados à Capitania e ao então Centro Nacional de Arqueologia Náutica e Subaquática (CNANS). Porém, a proximidade a que os vestígios se encontravam da superfície (apesar de cobertos por metros de sedimentos) motivaria alguma reserva da informação, "para que se salvaguardasse o achado", revela João Baptista, presidente da associação Barcos do Norte, entidade que há muito acompanha o processo.
Segundo o responsável, o CNANS promoveria, em 2000 e 2002, duas campanhas no local. Contudo, não viria a ser possível a localização exacta do sítio do naufrágio. As missões incidiriam na zona do Varadouro, a juzante da ponte de Fão, local do estuário do Cávado onde, noutros tempos, as embarcações fundeavam e onde se crê que a caravela tenha naufragado. Um fragmento dos madeiramentos trazidos à superfície e pertencentes à parte da ré do navio (o cadaste, ver foto) viria a ser datado, através de carbono 14, do ano de 1548, testes estes realizados em universidade dos Estados Unidos. Quanto às cerâmicas ali descobertas, João Baptista assinala que, dadas as suas formas e características, seriam provenientes de Barcelos, asseverando, a propósito, que "são em tudo semelhantes a peças descobertas em Aveiro, no local onde foi encontrado o astrolábio em ouro".
Defendendo a valorização e musealização do achado arqueológico, considerou que um estudo aprofundado permitiria "reescrever" uma parte da história: "Trata-se de reavivar uma importante parte da nossa herança e, no nosso entender, não há dinheiro que pague isso", vaticinou.

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

«Nova Águia» edita CD com palestra de Teixeira de Pascoaes

O quarto número da revista «Nova Águia», que inclui um CD com a voz de Teixeira de Pascoaes, é apresentado no próximo sábado na Biblioteca Municipal de Sesimbra. A revista, segundo Renato Epifânio, um dos seus directores, “assume o legado do movimento cultural da Renascença Portuguesa”.



O quarto número evoca os 20 anos da queda do Muro de Berlim e “procura reflectir sobre três vértices: Pascoaes; Portugal e a Europa”.
Adriano Moreira, Miguel Real, Pinharanda Gomes e Manuel Ferreira Patrício são alguns dos colaboradores deste número que inclui um CD com uma palestra de Teixeira Pascoaes gravada em 1952, no Porto.
“A gravação estava na posse da família e permite-nos hoje ouvir a voz mítica e lendária de Pascoaes. O filósofo José Marinho, quando a ouviu, afirmou que teve medo. É de facto uma voz cava, forte e profunda”, disse Renato Epifânio.
Na palestra, o autor de «A Arte de Ser Português» disserta sobre a “alma ibérica”. “Trata-se de um texto que seria o prólogo de uma obra a publicar intitulada «Epistolário ibérico - Cartas de Pascoaes a Unamuno», e que foi já publicado na revista Colóquio de Letras”, explicou o responsável.
O CD é inédito e, segundo Renato Epifânico, a revista não conta em próximos números voltar a editar qualquer CD. A «Nova Águia», com uma tiragem de 2000 exemplares, será apresentada sábado em Sesimbra, tendo ainda previstas apresentações na Quinta da Regaleira, em Sintra, a 7 de Novembro e dia 11 de Novembro às 15h00 no Colégio Militar, em Lisboa, e às 17h00, nos Paços do Concelho da capital.
Teixeira de Pascoaes é o pseudónimo literário de Joaquim Pereira Teixeira de Vasconcelos. Nascido em Amarante, em 1877, o escritor que se distinguiu como uma das principais vozes do movimento literário-filosófico Saudosismo, faleceu em 1952.
Entre as suas obras em poesia destacam-se os títulos «Marânus», «O Doido e a Morte» ou «Versos Pobres», enquanto em prosa escreveu as biografias romanceadas de S. Paulo, S. Jerónimo, Santo Antão e Camilo Castelo Branco, e para teatro publicou «Jesus Cristo em Lisboa», em colaboração com Raul Brandão. Colaborou também com Afonso Lopes Vieira no livro de poesia «Profecia».

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Quadro do deus romano está em exposição em Florença

Caravaggio pintou o seu auto-retrato no interior do jarro de vinho visível à direita de Baco, no famoso quadro do pintor do deus romano existente na Galeria dos Ofícios, em Florença, segundo peritos italianos citados hoje pela imprensa.

A descoberta foi feita por restauradores e investigadores, através de uma sofisticada análise com recurso a instrumentos da mais avançada tecnologia.

Os resultados da investigação serão hoje comunicados oficialmente ao Comité Nacional para as Celebrações do quarto centenário da morte do pintor, em 1610.
No interior do jarro, Caravaggio pintou a silhueta de um homem, de pé, com um braço estendido. Alguns traços do vulto são claramente distinguíveis, em particular o nariz e os olhos, sendo também perceptível um colarinho.
Os especialistas crêem poder hoje dizer-se que o pintor (1573-1610) fez o seu auto-retrato reflectido num jarro que tinha à sua frente enquanto estava a pintar.
Segundo o jornal italiano "La Stampa", há já algum tempo que se dizia que o vulto de Michelangiolo Merisi da Caravaggio deveria estar oculto num ponto qualquer do quadro, mas ninguém até hoje pudera demonstrá-lo.




Baco, um quadro a óleo de 95 por 85 centímetros, foi pintado por Caravaggio em 1596 e 1597 por encomenda do cardeal Del Monte para o oferecer a Fernando I de Medici, por ocasião do casamento do filho Cosimo II.

Temporada de Cravo começa sábado em Óbidos e homenageia Händel

Santuário do Senhor da Pedra é o cenário para os quatro concertos que constituem a Temporada de Cravo de Óbidos que começa sábado e termina a 21 de Novembro

A Temporada de Cravo que se realiza desde 2003, acontecerá pela primeira vez num único espaço da vila estremenha, precisamente onde em 1747 nasceu um dos mais importantes compositores portugueses de música sacra, designadamente para cravo, José Joaquim dos Santos.

«A aposta, este ano, é aumentar o número de espectadores, daí termos optado por um espaço maior», disse à Lusa José Parreira, da organização.
A edição deste ano é dedicada aos 250 anos da morte do compositor barroco alemão George Friedrich Händel (1685-1789).
Logo no concerto inaugural, sábado, às 21h30, João Paulo Janeiro apresenta um programa intitulado Música de Tecla de Händel e as suas influências, interpretando peças do compositor germânico, de Scarlatti, Couperin, Bach e Purcell. José Parreira afirmou que «Óbidos tem dedicado especial atenção ao Cravo, nomeadamente pelo facto de aqui ter nascido José Joaquim dos Santos, e além desta temporada tem apostado na investigação da sua obra, a edição de partituras e de CD com peças suas, mas também em dar apoio a novos cravistas».
O município adquiriu em 2000 um cravo, cópia de um Goemans-Taskin do género franco-flamengo 1764-1783, fabricado pelo italiano Guido Bizzi, que «músicos jovens podem tocar gratuitamente».
Sempre no Santuário do Senhor da Pedra, o segundo concerto da Temporada, com objectivos pedagógicos, acontece dia 7 de Novembro, também às 21h30.

O músico José Carlos Rodrigues interpretará suites para Cravo de Händel, e Jorge Rodrigues fará os comentários.
Tanto o cravista como o comentador estarão trajados com fatos da época de Händel (século XVIII).
No sábado seguinte, Ana Mafalda Castro (cravo) e Bruno Monteiro (violino) interpretam músicas de Händel, Bach e Carlos Seixas.
A Temporada encerra dia 21 com o ensemble La Main Gauche constituído por baixo contínuo, flauta de bisel, violoncelo barroco e contra tenor, que interpretarão peças de Häendel e Bach.
Lusa / SOL

Orquestra Nacional do Porto apresenta obras de Henze, Saint-Saëns, Franck e Richard Strauss

Obras de Henze, Saint-Saëns, César Franck e Richard Strauss compõem o programa do concerto que a Orquestra Nacional do Porto apresenta no sábado, na Casa da Música, sob a direcção do maestro titular, Christoph König, disse à Lusa fonte da instituição


Este concerto, concebido de forma a evocar o «contraste entre as paisagens de África e dos Alpes», conta com a presença do pianista russo Alexander Pirojenko, um dos vencedores do Prémio Internacional Vendôme de 2003 e laureado nos Concursos Emil Gilels e Horowitz.

O programa arranca com a obra de Hans Werne Henze La Selva Incantata, seguida de África, Op. 89, de Camille Saint-Saëns, e das Variações Sinfónicas, de César Franck, encerrando com a Sinfonia Alpina, de Richard Strauss.
La Selva Incantata entrelaça várias passagens da ópera O Rei Veado, a grande produção de Hans Werner Henze, escrita entre 1953 e 1956, que marcou a ruptura decisiva do compositor com a dogmática vanguarda europeia da época.
A enorme dimensão da ópera O Rei Veado (quatro horas mais intervalos), de Henze, e as grandes exigências cénicas e de elenco trouxeram problemas práticos.
Isto levou a que, muitos anos depois, o compositor tenha regressado a esta ópera para criar La selva Incantata, encomendada pela Ópera Estatal de Frankfurt para assinalar a sua reabertura em Abril de 1991.
Viajante entusiasta, Camille Saint-Saëns escapava frequentemente ao rigor do Inverno parisiense e à pressão da vida musical da cidade, fazendo férias prolongadas em zonas temperadas.
Em 1889/90 visitou Granada e Cádis e passou depois vários meses nas Ilhas Canárias, tendo composto, durante este período África, uma fantasia num único andamento para piano e orquestra.
As Variações Sinfónicas, de César Franck, fazem parte do conjunto das suas obras-primas tardias, são consideradas pela crítica como tendo sido influenciadas por Tristão e Isolda, de Wagner.
A obra, que data de 1885, foi escrita para o pianista Louis Diémer, como um agradecimento por ter tocado a parte solo do poema sinfónico Les Djinns, de Franck, no ano anterior.
A Sinfonia Alpina, de Richard Strauss, é considerada como «um hino à natureza, com uma descrição detalhada não apenas de sentimentos mas também da paisagem e do clima».
De acordo com os historiadores, o plano da obra foi sugerido por uma viagem de escalada na qual o compositor tinha participado aos 14 anos.
A Sinfonia Alpina está escrita sumptuosamente para uma orquestra de 100 ou mais elementos, incluindo um órgão e, fora do palco, um grupo extra de mais 16 metais, sendo este colectivo essencialmente usado «não para produzir peso e poder sonoro puro, mas para gerar cores em constante variação num equilíbrio perfeito e consistente».


Lusa / SOL

CCB evoca Jorge de Sena no octogésimo aniversário do seu nascimento

O Centro Cultural de Belém evoca no domingo Jorge de Sena, nascido faz dia 2 de Novembro 80 anos, promovendo a leitura de poemas e contos do poeta, dramaturgo, ficcionista e ensaísta e a projecção do filme Sinais de fogo, baseado no único romance que escreveu

Entre as 14h30 e as 17h lerão os poemas Fernando Luís Sampaio, Luísa Cruz, Mafalda Lopes da Costa, Jacinto Lucas Pires e Helena Barbas.

A partir das 17h15, Jorge Vaz de Carvalho e o realizador de Sinais de Fogo, Luís Filipe Rocha, conversarão sobre o filme Sinais de Fogo, que será projectado logo a seguir.
«Agente de uma certa ideia do amor ('só não é belo o que se não deseja ou o que ao nosso desejo mal responde') e da liberdade ('o resistir a tudo o que pretende diminuir-nos ou confinar-nos'), Jorge de Sena foi acima de tudo um agitador das ideias feitas, um corsário das palavras, um salteador de tesouros escondidos na nossa alma», escreve o CCB numa nota, a propósito da evocação.
Na mesma nota, Sena aparece descrito como «um fora-da-lei da consciência portuguesa do século XX», como alguém que «fez do exílio uma razão acrescida de amar mais dolorosamente o país que era o seu».
Sena faleceu há 31 anos nos Estados Unidos. Os seus restos mortais foram trasladados em Setembro último daquele país para o Cemitério dos Prazeres, em Portugal.

Hoje reconhecido como um dos maiores poetas e uma das figuras centrais da Cultura e do Pensamento do século XX português, Sena saiu de Portugal em 1959, «receando - segundo Jorge Fazenda Lourenço, um dos principais estudiosos da sua obra - as perseguições políticas resultantes de uma falhada tentativa de golpe de estado, a 11 de Março desse ano», em que esteve envolvido.
Tinha então 40 anos e era já autor de cinco títulos de poesia - Perseguição (1942), Coroa da Terra (1946), Pedra Filosofal (1950), As Evidências (1955) e Fidelidade (1958) - que deixaram marca indelével nas Letras portuguesas.
A par da escrita, Sena desenvolvera uma intensa actividade de conferencista e crítico em jornais e revistas, de coordenador editorial e consultor literário, colaborando ainda nos Cadernos de Poesia.
Para o ensaísta Fernando J. B. Martinho, profundo conhecedor da obra de Sena, As evidências é «o ponto mais alto do que poderia considerar-se a primeira fase» da sua produção poética, precisamente a que inclui as cinco obras citadas.
«Sempre a poesia de Sena soube dialecticamente combinar a 'disciplina' e o excesso, a ordem e o 'tumulto', o 'clássico' e o moderno, e isso, em parte, ajudará a explicar o fascínio que por ela experimentam os que iniciaram o seu percurso no ocaso do paradigma modernista», escreveu Martinho, sobre o conjunto da obra poética seniana.
No Brasil, a primeira etapa do seu exílio, Sena permaneceu seis anos, até 1965, período em que deu à estampa Metamorfose (1963), os ensaios de Da poesia portuguesa, O Poeta é um fingidor, O reino da estupidez, Poesia I, o primeiro volume da sua obra poética completa, os contos de Andanças do Demónio e Os ensaios de Camões e o soneto quinhentista peninsular, que apenas seria publicado em 1969.
Nos Estados Unidos, a partir de Outubro de 1965 fez parte do corpo docente da Universidade de Wisconsin, Madison, sendo nomeado professor catedrático efectivo em 1967.
Três anos depois, mudou-se para a Universidade da Califórnia, Santa Bárbara, onde ocupou os cargos de director do Departamento de Espanhol e Português e do Programa de Literatura Comparada.

Lusa / SOL



Mais sobre Jorge de Sena
http://www.astormentas.com/sena.htm
http://cvc.instituto-camoes.pt/figuras/jdesena.html
http://portugal.poetryinternationalweb.org/piw_cms/cms/cms_module/index.php?obj_id=9657

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

A Fé na literatura para desfazer a infidelidade bíblica

O tema do novo livro de José Saramago não é inédito na sua obra e até lhe valeu o empurrão para o exílio em Lanzarote mas, desta vez, "deus" surge cru e sem a beleza narrativa de "O Evangelho Segundo Jesus Cristo". Nunca o Prémio Nobel da Literatura foi tão a fundo em tão pouca narrativa e nem surpreendera os seus leitores com passagens em que domina um erotismo com uma componente inédita na sua obra



Após a surpresa que a ironia e o humor de A Viagem do Elefante provocaram nos leitores de José Saramago, surge o tempo para a estupefacção perante a sua continuada irreverência religiosa e um sorriso - que pode ser amargo ou trocista - para com a revisão bíblica proposta pelo Nobel em Caim. Livro de uma só palavra no título, José Saramago faz neste breve romance (181 p.) a reconversão de algumas das parábolas que têm estruturado a religião católica e devolve-as aos crentes da Terra como um cometa esponjoso e desinflamado.
Com Caim, o autor continua um novo ciclo de escrita iniciado com a obra anterior e no qual, despretensiosamente, conta uma história distante daqueles monumentos que ergueu ao criar Levantado do Chão, Memorial do Convento, O Evangelho Segundo Jesus Cristo, Ensaio Sobre a Cegueira e A Caverna. Não o faz para exercitar a pena, nem abandona o "truque" de partir de uma importante premissa a dominar a narrativa, como lhe foi sempre habitual. A deste livro que, contrariamente à genial quebra de laços com a Europa que abria e - disse-o o escritor - esvaziava um pouco A Jangada de Pedra, o remate literário rivaliza com a tese da reinterpretação da personagem irmão de Abel que percorre o texto.
Não se vai aqui desvendar o final surpreendente mas pode dizer--se que advém de Noé e da sua Arca, uma passagem da Bíblia que permite a José Saramago fechar a sua viagem por aqueles tempos com o apego que tem à ficção científica, facto patenteado em muitas das suas crónicas das décadas dos anos 60 e 70. Quando se refere este conceito de viagem no tempo não é uma metáfora para falar de Caim, mas a forma que Saramago encontrou para reunir nesta pilha de páginas alguns dos mitos que pretende explicar ao seu modo. Já se o esperava após as primeiras palavras que anunciavam este "dilúvio" que hoje começa a "chover" em vários países - América Latina e Espanha - e que em Portugal contabiliza 50 mil exemplares à primeira edição depois de ter sido apresentado ao mundo na Feira do Livro de Frankfurt, na semana passada.
Este dilúvio reformista que Caim sugere veio acompanhado de declarações contra o próprio Papa, nas quais o escritor já amaldiçoado pela hierarquia católica desde que O Evangelho Segundo Jesus Cristo viu a luz do dia, proclamou em Roma aquando do lançamento da tradução proibida por Silvio Berlusconi de O Caderno. O português definira Bento XVI como "cínico" e referira que a "insolência reaccionária" da Igreja necessitava ser combatida com a "insolência da inteligência viva". O cinismo advinha de Ratzinger ter "a coragem de invocar Deus para reforçar seu neomedievalismo universal, um Deus que ele jamais viu, com o qual nunca se sentou para tomar um café, mostra apenas o absoluto cinismo intelectual", enquanto a insolência reaccionária resulta de não ser permitido que "a verdade seja ofendida todos os dias por supostos representantes de Deus na Terra, os quais, na verdade, só têm interesse no poder".
Caim trata essas razões de queixa de José Saramago em relação à Igreja através de bastantes exemplos. Utiliza o protagonista - "deus" aparece como uma das personagens - que matou o seu irmão numa deambulação pela Terra dos tempos iniciais a partir de Adão e Eva e prossegue até Noé atracar no monte Ararat.
Pelo meio, recorrendo ao já referido artifício de viagens no tempo, Caim vai palmilhando paisagens inóspitas - como as de Lanzarote - e verdejantes - como as da sua Azinhaga de infância -, assistindo a "factos históricos" que preenchem as recordações dos católicos quanto aos seus antepassados. Caim assiste ao desregulado confronto linguístico de Babel, assombra-se com a destruição de Sodoma e Gomorra, evita a punhalada de Abraão no filho porque o anjo chega atrasado, testemunha as desgraças que afligem o crente Job, pasma-se com a queda de Jericó e observa as disputas entre "deus" e satã. É, aliás, esta última temática a única que faz lembrar o romance O Evangelho Segundo Jesus Cristo durante toda a leitura de Caim.
Uma faceta inesperada do escritor José Saramago, que surpreenderá o leitor habituado ao insosso erotismo na literatura de língua portuguesa, encontra-se a partir da página 52. Não é a primeira vez que coloca pouca distância entre o corpo das personagens e que descreve paixões e a sua consumação mas, desta vez, a narrativa acaba por oferecer ao leitor algumas das mais bem descritas insinuações eróticas e actividades sexuais em português. No capítulo em que Caim e Lilith se encontram, há um desvendar da sexualidade do protagonista através de uma primeira esfrega que o liberta do pó da estrada realizada por duas escravas e de uma segunda esfrega de amor físico que parece antecipar o guião para todos os casais do futuro.
Este erotismo literário não se fica por aqui e, após Lilith - que marca a presença da mulher forte neste livro -, outras mulheres e "comércio carnal" reaparecerão, umas vezes sob o trato normal e noutras sob a necessidade de uma procriação encomendada e não assexuada que satisfaz mulheres para além de uma idade pouco habitual. Não faltam ainda neste capítulo os desmandos homossexuais em Sodoma que quase vitimam dois anjos!
Caim não fugiu ao habitual secretismo com que José Saramago protege os seus livros. Dele só se sabia que o título seria feito de uma palavra apenas e nunca o autor se descoseu sobre o assunto que abordaria. Comentou apenas que se A Viagem do Elefante era um livro optimista, este seria pessimista. A primeira revelação surgiu no blogue do escritor (www.josesaramago.org) feita por Pilar del Río ao anunciar: "Saramago escreveu outro livro." Logo aí explicava: "Não é um tratado de teologia, nem um ensaio, nem um ajuste de contas: é uma ficção em que Saramago põe à prova a sua capacidade narrativa ao contar, no seu peculiar estilo, uma história de que todos conhecemos a música e alguns fragmentos da letra." E, acrescentava, que Caim é um livro "para pessoas que usam a razão na altura de abordar a vida" e que "a grande literatura é sempre provocatória". Por isso, garantia: "Haverá pessoas que se poderão dar por ofendidas", mas também explicava que tinha sido escrito em apenas quatro meses porque o autor tinha "urgência em dizê-lo".
Será impossível ignorar a polémica provocada por O Evangelho Segundo Jesus Cristo, mas o Nobel, segundo declarações que fez à EFE, não teme que o voltem a crucificar: "Alguns talvez o façam mas o espectáculo será menos interessante." Considera que "O Deus dos cristãos não é esse Jeová", que "Os católicos não lêem o Antigo Testamento" e se "Os judeus reagirem, não me surpreenderei. Já estou habituado".
Para José Saramago, segundo referiu ao Estado de S. Paulo, "Caim é um livro escrito contra toda e qualquer religião. Ao longo da história, todas as religiões, sem excepção, fizeram à humanidade mais mal que bem. Todos o sabemos, mas não extraímos daí a conclusão óbvia: acabar com elas. Não será possível, mas ao menos tentê--mo-lo." Sugere que tal se verifique pela análise e crítica implacável porque "A liberdade do ser humano assim o exige." E não evita deixar bem esclarecido que "o cérebro humano é um grande criador de absurdos e Deus é o maior deles".
O lançamento de Caim decorreu ontem à noite em Penafiel, cidade onde José Saramago foi o homenageado da 2.ª edição do festival literário Escritaria. Terá no dia 30 o lançamento oficial na Culturgest, em Lisboa, que contará com a apresentação do pensador Eduardo Lourenço.

"O Livro de Ouro de Astérix" quinta-feira em Portugal

O irredutível gaulês completa 50 anos, celebrados na próxima quinta-feira com o lançamento de "O Livro de Ouro de Astérix", assinado por Albert Uderzo. E esse será o principal evento das celebrações: um álbum de 56 páginas com o maior evento festivo preparado para os irredutíveis gauleses.


Seguindo a tradição das bodas de ouro no casamento, os 50 anos de Astérix também terão direito a um Livro de Ouro.
O lançamento será simultâneo em vários países, incluindo Portugal onde será colocado à venda às 00:00 do dia 22, numa operação que decorrerá na Fnac do Centro Comercial Colombo, em Lisboa. Aqui a editora responsável pela publicação será mais uma vez a ASA, que sempre publicou a colecção de histórias de Astérix e Obélix.
Em França, a celebração dos 50 anos dos heróis que resistiam ao invasor romano numa aldeia da Gália, envolve um programa de actividades que inclui, por exemplo, a participação da Força Aérea e dos Correios.
René Goscinny (já falecido) e Albert Uderzo deram a conhecer o universo de Astérix a 29 de Outubro de 1959, nas páginas da revista francesa Pilote, e a parceria durou até 1977, ano da morte do argumentista.
A primeira história “Astérix, o Gaulês” foi publicada em 1961 e apresentava um pequeno gaulês loiro de bigode farfalhudo que tinha como grande amigo um gordo ruivo desajeitado e com uma força desmesurada chamado Obélix que carregava menires e adorava comer javalis.
Ambos são habitantes de uma invencível aldeia que resiste às investidas militares dos romanos dirigidos por Júlio César, graças a uma secreta poção mágica inventada pelo druida Panoramix.
Entre as personagens que povoam o imaginário criado por Uderzo e Goscinny contam-se ainda Abraracourcix, o chefe da aldeia, o bardo Assurancetourix e o pequeno cão Ideiafix.

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

O povo português by Guerra Junqueiro



"Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio,


fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora,

aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias,

sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice,

pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas;

um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai;

um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom,

e guarda ainda na noite da sua inconsciência como que

um lampejo misterioso da alma nacional,

reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta.



Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula,

não descriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha,

sem carácter, havendo homens que, honrados na vida íntima,

descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas,

capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira à falsificação,

da violência ao roubo, donde provém que na política portuguesa sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverosímeis no Limoeiro.



Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo;

este criado de quarto do moderador; e este, finalmente,

tornado absoluto pela abdicação unânime do País.



A justiça ao arbítrio da Política,

torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas.



Dois partidos sem ideias, sem planos, sem convicções,

incapazes, vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos,

iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero,

e não se malgando e fundindo, apesar disso,

pela razão que alguém deu no parlamento,

de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar."

Guerra Junqueiro, 1896.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Museu Paula Rego


Não é propriamente o tipo de história a que estamos habituados. Portugal: num país onde são mais comuns as colecções que procuram museu e que conhece, como alternativa, museus sem orçamento para constituir colecções, eis, de repente, este caso: o da Casa das Histórias Paula Rego. Avenida da República, Cascais, à direita depois da Cidadela, afastando-nos ligeiramente da baía e do centro histórico, uma avenida ampla, algo árida. Faixas de rodagem, carros para cá e para lá, uns quantos prédios e moradias escondidos por grades e sebes, e, agora, no número 300, um muro baixo e reboludo, pouco mais do que à altura do nosso peito, a deixar ver um relvado espesso e fofo como um tapete de lã cruzado por um discreto caminho de pedra e cortado a dada altura por uma elegante frente de eucaliptos frondosos. Lá ao fundo, por detrás desta harmoniosa moldura natural, uma construção cor de barro, um edifício térreo e quase cego do qual irrompem duas torres em forma de pirâmide, tudo num vermelho Ferrari que desmaiou e começou a fazer-se rosa-velho.Aparição misteriosa esta, perfume vago a exotismo tumular de civilização antiga, mas, ao mesmo tempo, com qualquer coisa discreta e muito cá de casa, escala inesperadamente humana e quente, sem os sobressaltos e espantos epifânicos que a maioria da arquitectura museológica contemporânea mais conhecida tem vindo a impor na paisagem internacional. Duas torresUm piso térreo com uma entrada baixa e duas torres: esta é a Casa das Histórias Paula Rego vista de fora, a mesma que se prevê que o Presidente da República Aníbal Cavaco Silva e Paula Rego, ela própria, inaugurem oficialmente hoje pelas 11h00, e que na inauguração ao público, às 18h00, receberá largas centenas de convidados.Desde que assumiu funções, em 2006, Cavaco Silva - e Portugal com ele - teve oportunidade de assistir a dois momentos do género, o primeiro logo no ano da sua tomada de posse, quando a Fundação Ellipse abriu portas em Alcoitão; o segundo em 2007, quando o Centro de Exposições do Centro Cultural de Belém reabriu como Museu Colecção Berardo de Arte Moderna e Contemporânea, em Lisboa. Dois museus, duas controvérsias: após anos de tensões, ameaças e polémicas, Cavaco Silva aprovou, mas afirmou ter dúvidas sobre o modelo do Museu Berardo - questionou a distribuição de poderes entre o Estado e Joe Berardo, o conhecido coleccionador e investidor que cedeu a sua conhecida colecção por dez anos ao país mediante a criação de um pólo permanente para a sua exposição; quanto à Fundação Ellipse, continua com destino incerto meses depois de lançadas as investigações sobre as actividades do Banco Privado Português (BPP) e do seu ex-presidente, João Rendeiro - a empresa de auditoria Delloite apurou em Fevereiro que a Colecção Ellipse, um dos mais importantes acervos de arte contemporânea do país, com cerca de 800 obras de alguns dos mais relevantes artistas internacionais, pertence em 83 por cento ao BPP, e não a Rendeiro, como se pensava, tendo aconselhado a venda como medida de saneamento das contas do banco. Perante isto, à primeira vista, parece simples a história do museu dedicado a Paula Rego, "uma das maiores pintoras vivas" do mundo, segundo o Finantial Times, que, a propósito da inauguração da Casa das Histórias, dedicou recentemente um longo artigo à pintora, a mais internacional artista portuguesa viva, ou a mais portuguesa das artistas inglesas, dependendo da perspectiva. Uma história simples, dizíamos: primeiras conversações entre Paula Rego e a Câmara Municipal de Cascais, presidida por António Capucho, em 2004. Menos de dois anos volvidos e com o projecto de arquitectura entregue a Eduardo Souto de Moura, a artista, radicada em Londres há mais de 30 anos mas nascida no Estoril, onde ainda tem uma casa de família, estava a assinar um contrato de doação e empréstimo por dez anos de uma centena de obras de pintura, desenho e gravura, trabalhos correspondentes a um percurso de cinco décadas, dos anos 1960 à actualidade. Com um orçamento de obra de 5,3 milhões de euros, vindos do Programa de Investimento e Qualificação do Turismo, a primeira pedra do museu foi lançada no início de 2008 e, meio ano depois, ficava apontada uma directora, Dalila Rodrigues, antiga directora do Museu Nacional de Arte Antiga.É Dalila Rodrigues que nos recebe para uma primeira visita ao espaço, já com a exposição inaugural montada. A visita de Paula"A ideia é que o museu seja também a concretização da visão de Paula Rego", diz-nos à partida. O percurso é cronológico e divido em quatro grandes zonas temáticas. Na primeira sala, trabalhos correspondentes aos dez primeiros anos, de uma Life Painting datada de 1954, altura em que Paula Rego era aluna da Slade School of Fine Arts, de Londres, a obras como Quando Tínhamos uma Casa de Campo (1961) ou O Exílio (1963), técnicas mistas com colagem que cruzam já o statement político com referências da esfera familiar e pessoal da artista. Depois, o salto é para os anos 1980, quando Paula Rego abandona a colagem e se dedica a um figurativismo cada vez mais assumido em obras como O Macaco Vermelho Bate na Mulher (1981) ou a grande série Óperas (1983), das quais se apresentam, em simultâneo, cinco grandes telas e cinco pequenas aguarelas preparatórias. A etapa seguinte - 1994 a 2005 - assume como marco a introdução do pastel na obra de Paula Rego com Mulher Cão, trabalho apresentado na sala de exposições temporária e que abre caminho para obras cada vez mais realistas e, simultaneamente, teatrais, como Entre as Mulheres (1997), da série O Crime do Padre Amaro, o conhecido e imponente Anjo (1998) ou o tríptico The Pillowman (2005). Apesar de presente noutros momentos, a gravura compõe a última etapa - 1988-2007 - de trabalhos das conhecidas séries Nursery Rhymes, a primeira em que a artista usou esta técnica, e Jane Eyre, baseada na obra homónima de Charlotte Brontë, a litografias mais recentes como as séries Príncipe Pig. A sala de exposições temporárias está pensada como última visita. É onde até 18 de Março se expõe um conjunto de obras emprestadas pela Galeria Marlborough, a representante internacional de Paula Rego, com trabalhos icónicos como a Filha do Polícia (1986), a série Avestruzes Bailarinas (1995), baseadas em Walt Disney, ou O Vasto Mar de Sargaço (2000), inspirado na obra homónima de Jean Rhys. "O museu ideal para mim é aqui. É um sítio mágico, muito especial. Não poderia ter um sítio melhor", dizia Paula Rego na altura da assinatura do protocolo de empréstimo e doação de obras, explicando desejar um espaço "despretensioso, divertido, vivo". No início da semana, com a primeira exposição montada, explicava-nos: "Os trabalhos são o menos importante de um museu. O que é importante aqui são as nossas histórias, as nossas histórias portuguesas, que dão vida a tudo".

Mocidade Portuguesa

http://static.publico.clix.pt/docs/cultura/mpf/index.html


De vez em quando descobrem-se estas preciosidades!!!!!

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

chocalhos, badalos e outras coisas


ver, rever e ouvir...The Beatles


Vídeos dos Beatles, todas as músicas com as respectivas letras.

A Day in the Life
A Hard Day's Night
A Taste of Honey
Across The Universe
Act Naturally
All I've got to Do
All My Loving
All Together Now
All You Need Is Love
And I Love Her
And Your Bird Can Sing
Anna (Go To Him)
Another Girl
Any Time
Ask Me
Baby You're A Rich Man
Baby's in Black
Back In The USSR
Bad Boy
Because
Being for the Benefit of Mr. Kite!
Birthday
Blackbird
Blue Jay WayBoys
Can't Buy Me Love
Carry That Weight
Chains
Come Together
Cry Baby Cry
Day Tripper
Dear Prudence
Devil In Her Heart
Dig A PonyDig It
Dizzy Miss Lizzie
Do You Want to Know a Secret
Doctor Robert
Don't Bother Me
Don't Let Me Down
Don't Pass Me By
Drive My Car
Eight Days a Week
Eleanor Rigby
Every Little Thing
Everybody's Got Something to Hide
Everybody's Trying to be
Fixing a Hole
Flying (instrumental)
For No One
For You Blue
Free As A Bird
From Me To You
Get Back
Getting Better
Girl
Glass Onion
Golden Slumbers
Good Day
Morning, Good Morning
Good Night
Got To Get You Into My Life
Happiness is a Warm
Hello, Goodbye
Help
Helter Skelter
Her Majesty
Here Comes The Sun
Here, There And Everywhere
Hey Bulldog
Hey Jude
Hold Me Tight
Honey Don'tHoney Pie
I Am the Walrus
I Call Your Name
I Don't Want to Spoil the Party
I Feel Fine
I Me Mine
I Need You
I Saw Her Standing There
I Should Have Known Better
I Wanna Be Your Man
I Want To Hold Your Hand
I Want To Tell You
I Want You (She's So Heavy)
I WillI'll Be Back
I'll Cry Instead
I'll Follow the Sun
I'll Get You
I'm a Loser
I'm Down
I'm Just Happy to Dance with
I'm Looking Through You
I'm Only Sleeping
I'm so tired
I've Got A Feeling
I've Just Seen a Face
If I Fell
If
In My Life
It Won't Be Long
It's All Too Much
It's Only Love
Julia
Kansas City/Hey, Hey, Hey, HeyKomm Gib Mir
Lady Madonna
Let it Be
Little Child
Long Tall Sally
Long, Long, Long
Love Me Do
Love You To
Lovely Rita
Lucy in the Sky with Diamonds
Maggie Mae
Magical Mystery Tour
Martha My Dear
Matchbox
Maxwell's Silver Hammer
Mean Mr. Mustard
Michelle
Misery
Money (That's What I Want)
Mother Nature's Son
Mr. Moonlight
No Reply
Norwegian Wood
Not a Second Time
Nowhere Man
Ob-La-Di, Ob-La-Da
Octopus's Garden
Oh! Darling
Old Brown Shoe
One After 909
Only A Northern Song
P.S. I Love You
Paperback Writer
Penny Lane
Piggies
Please Mister Postman
Please Please Me
Polythene
Rain
Real Love
Revolution 1
Revolution 9
Rock and Roll
Rocky Raccoon
Roll Over Beethoven
Run For Your Life
Savoy Truffle
Sexy Sadie